Pode a comunicação salvar o planeta?
30 Abril 2025
Enfrentamos, atualmente, múltiplas crises que colocam em causa a sobrevivência da espécie humana neste belo planeta. Devido à insustentabilidade das nossas práticas, levamos a natureza à exaustão, resultado da sobrexploração e contaminação dos seus recursos, acelerando processos naturais como as alterações climáticas e decimando ecossistemas inteiros, necessários ao bom funcionamento e equilíbrio da vida na Terra. Porém, tal como Sir David Attenborough afirmou na sua primeira publicação na rede social Instagram, em 2020, “salvar o nosso planeta é agora um desafio de comunicação”.
Texto de Sara Rêgo

Imagem de kjpargeter na Freepik
Tal como o reconhecido radialista, biólogo, historiador natural e escritor britânico destaca, temos os factos sobre o que está a acontecer, agora é necessária uma comunicação bem-sucedida e efetiva para promover a alteração de atitudes e comportamentos em prol de práticas mais sustentáveis, com reduzido impacto para a sociedade e para o planeta. Contudo, o conceito de sustentabilidade é um vasto território, no qual se cruzam várias dimensões sociais, económicos e ambientais e, portanto, uma tarefa árdua no que toca à sua comunicação.
Mas porque é que é tão difícil comunicar sustentabilidade?
A sustentabilidade, e todos os temas a ela inerentes, é altamente complexa, ambígua e ampla. O seu entendimento implica o desenvolvimento de um pensamento sistémico, que compreenda a interconectividade dos problemas e interdependência de todos os seres vivos, desde o microscópico à escala planetária, dos quais depende a sociedade humana. Porém, de acordo com Robinson (2018), “os nossos cérebros não estão programados para processar interconectividade e pensamento sistémico; estamos programados para ver essencialmente causa e efeito” (Robinson, 2018, p.4), logo, tudo o que implique uma visão mais holística do funcionamento interdependente dos sistemas naturais e a sua relação com a vida humana, torna-se um desafio à comunicação.
Mais ainda, o conceito de sustentabilidade e desenvolvimento sustentável são muitas vezes usados como sinónimos, apesar de serem distintos – o primeiro é visto como um estado futuro imaginado e o segundo como um processo (ou conjunto de processos) que nos conduzirá a esse estado. Todavia, também o desenvolvimento sustentável, tal como qualquer outra ideia promovida pela Organização das Nações Unidas (ONU), é bastante abrangente de forma a poder ser inclusivo e, como consequência, torna-se demasiado vago e ambíguo. Sendo desenvolvimento sustentável o desenvolvimento que visa atender às necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de atender às suas próprias necessidades, estamos perante um conceito que engloba necessidades presentes e futuras de países desenvolvidos e em desenvolvimento, as quais são amplamente diversas e implicam uma responsabilidade intra e intergeracional.
Da interdependência dos temas da sustentabilidade, a qual é tão difícil de compreender, resulta também aquilo a que se chama de “problemas perversos” (wicked problems), ou seja, complexos, interconectados e de difícil resolução porque estão sempre a evoluir. A somar à complexidade do tema, estão também as questões da atenção seletiva, que filtra a informação que as pessoas recebem de acordo com o que estas procuram, e o viés de confirmação (confirmation bias), ou seja, a tendência de prestarmos atenção apenas a informação que confirma as nossas crenças (Robinson, 2018). Comunicar temas abstratos que envolvem uma vasta escala de tempo e complexidade (ex.: as alterações climáticas) é extremamente difícil e quase impossível relacioná-los com a experiência humana (Barber, 2021).
A Comunicação para a Sustentabilidade
A nossa investigação prendeu-se com o estudo da Comunicação para a Sustentabilidade, como um novo paradigma de comunicação mais dialogado, transparente e participativo, contrastante com os processos de comunicação tracionais, mais capitalistas e massificados. Adotamos a designação de “Comunicação para a Sustentabilidade” como tradução para Sustainability Communication, pois, de acordo com Genç (2017), “a comunicação não é meramente sobre partilhar informação relativa à sustentabilidade ou consciencializar para temas da sustentabilidade. O objetivo da Comunicação para a Sustentabilidade é o de estabelecer uma transformação social na base dos objetivos normativos de desenvolvimento sustentável” (Genç, 2017, p.515). Como consequência, a Comunicação para a Sustentabilidade não se foca só no emissor e na transmissão da mensagem, isto é, uma comunicação unidirecional; mas sim, promove a “deliberação, participação e discurso públicos” numa comunicação bidirecional sobre o que é a sustentabilidade (Guillen-Hanson et al.,2021, p.269). Enquanto a comunicação “de” sustentabilidade é mais sobre persuasão, está centrada no emissor e é unidirecional (um para muitos), a comunicação “sobre” sustentabilidade é mais deliberativa, horizontal e focada no discurso (de muitos para muitos), porém, a comunicação “para” a sustentabilidade é sobre aprendizagem social (Newig et al., 2013) e, nesse sentido, “procura empoderar as pessoas para terem um papel ativo na transformação dos processos” (Guillen-Hanson et al.,2021, p.269). Para Barber (2021), esta comunicação tem duas funções, por um lado, aumentar a consciencialização pública sobres os temas da sustentabilidade, sobretudo os desafios ambientais, e, por outro, envolver as pessoas em práticas, comportamentos, estilos de vida e políticas sustentáveis. Contudo, o desafio da Comunicação para a Sustentabilidade é, pois, chegar a um entendimento, comportamento e políticas ideais que se traduzam em ações concretas para endereçar os vários desafios atuais (Barber, 2021).
O desenvolvimento do conceito de Comunicação para a Sustentabilidade resulta da necessidade de reconsideração da relação entre pessoas e planeta e sua reintegração no discurso social, com o intuito de refletir interações responsáveis entre seres humanos e o ambiente natural e social.
Como resultado do nosso estudo, verificamos que a maioria das empresas estão longe de adotar este novo paradigma de comunicação, privilegiando uma comunicação “de” sustentabilidade, unidirecional, centrada no emissor (empresa) e com o objetivo específico de transmitir uma mensagem.
Contudo, se queremos mudar o mundo, precisamos de um discurso mais próximo, que restabeleça a interligação de sistemas, que empodere e incite à participação ativa das partes interessadas para a construção de soluções para os desafios atuais.
Bibliografia
- Barber, J. (2021). The Challenge of Imagining Sustainable Futures: Climate Fiction in Sustainability Communication. In F. Weder, L. Krainer, & M. Karmasin (Eds.), The Sustainability Communication Reader: A Reflective Compendium (pp. 143–160). Springer Fachmedien https://doi.org/10.1007/978-3-658-31883-3_9
- Genç, R. (2017, outubro). The Importance of Communication in Sustainability & Sustainable Strategies. Comunicação apresentada na 14th Global Conference on Sustainable Manufacturing, Stellenbosch, África do Sul. https://doi.org/10.1016/j.promfg.2017.02.065
- Guillen-Hanson, Georgina & Vergragt, Philip & Fischer, Daniel. (2021). Communicating Sustainable Consumption. 10.1007/978-3-658-31883-3_15.
- Newig, J., Schulz, D., Fischer, D., Hetze, K., Laws, N., Lüdecke, G., & Rieckmann, M. (2013). Communication Regarding Sustainability: Conceptual Perspectives and Exploration of Societal Subsystem. Sustainability 5(7), 2976–2990. https://doi.org/10.3390/su5072976
- Robinson, S., & Eilert, M. (2018). The role of message specificity in corporate social responsibility communication. Journal of Business Research, 90, 260–268. https://doi.org/10.1016/j.jbusres.2018.05.028
